terça-feira, 2 de novembro de 2010

Eu e a Sra. Mali Villas Boas no III Salão de Inverno da galeria dela

A Palavra
Já não quero dicionários
consultados em vão.
Quero só a palavra
que nunca estará neles
nem se pode inventar.

Que resumiria o mundo
e o substituiria.
Mais sol do que o sol,
dentro da qual vivêssemos
todos em comunhão,
mudos,
saboreando-a.

Carlos Drummond de Andrade, in 'A Paixão Medida'

A palavra - Exposição Kromossoma

Os invisíveis
Texto reflexivo sobre o filme que retrata o Massacre de Columbine

Uma escola é um universo heterogênio, onde facilmente se identificam as fragilidades de uma sociedade. Os jovens que lá estão são o reflexo de famílias desagregadas, de problemas sociais decorrentes da pobreza, da violência doméstica, das deficiências de caráter dos pais, da falta de orientação e muitas vezes da falta de amor dentro de seus próprios lares. Não estamos identificando a unidade familiar como o único responsável pelo insucesso dos filhos, mas como o início de diversos problemas que hoje nos afligem.
É interessante notar a preocupação dos pais com a colocação dos filhos no mercado de trabalho. O sucesso profissional para muitos é a chave da felicidade e da realização pessoal. Um exemplo disso é a exacerbada ansiedade dos pais em verem os filhos alfabetizados já com 5 anos, antes mesmo de iniciarem o ensino fundamental. Grande parte dos pais não se preocupa com os primeiros anos da criança na escola, optando inclusive por cursos pré-escolares mais baratos, afinal o brincar é visto como mera atividade recreativa. A fase pré-escolar passa a ser considerada por muitos como uma transferência de responsabilidade no olhar os filhos enquanto os pais trabalham.
Nota-se que o investimento pecuniário maior dos pais no setor da educação é no ensino médio e na faculdade. Mas e a educação infantil? Muitos daqueles que futuramente pretendem matricular seus filhos em boas escolas para a preparação para o vestibular, que garantirá as portas abertas das melhores universidades, não investem neste período, optando por escolas com menos estrutura ou mesmo por colocar a criança na escola somente a partir dos 6 anos (início do ensino obrigatório).
Mesmo aqueles que optam por um ensino de qualidade já na educação infantil, estão preocupados em manter desde logo um aprendizado eficiente do ponto de vista mercadológico. São poucos os que lembram que a personalidade da criança, que verdadeiramente determinará sua realização pessoal, é formada até os sete anos.
O resultado nos primeiros anos do ensino fundamental é de grande quantidade de crianças com hiperatividade, falha de processamento auditivo, déficit de concentração, inadequação social etc. Daí a migração para os consultórios médicos e para os psicólogos, para tentar contornar um problema que poderia ser evitado muitas vezes se os pais tivessem prestado atenção aos seus próprios filhos.
Quando os filhos são pequenos muitos não dispõem de paciência e tempo para gastar com os filhos, acompanhando e contribuindo para seu desenvolvimento emocional. A construção de um ser humano começa em casa, desde o desejo da concepção. O estar presente na vida das crianças é de suma importância para que sua auto-estima e segurança se desenvolvam adequadamente. A vida contemporânea, que exige dos adultos sucesso profissional para que possam ser supridas todas as necessidades materiais do indivíduo e de sua família, não pode roubar desta a atenção e o carinho dos pais. O conforto não garante a felicidade e a satisfação do homem enquanto ser humano.
A educação das crianças deve ser conjunta. De nada adianta a escola passar valores, que não são presenciados pela criança dentro de casa. O discurso teórico não é eficaz se não se vive aquilo que se prega. Daí a necessidade dos pais estarem a par da política da escola e permitirem que esta atue como parceira na educação dos filhos, que é obrigação dos pais.
A escola deve estar atenta ao que acontece dentro e fora de seus muros, afim de que possa garantir, além de educação, o bem estar de todos. Diariamente somos alvo de notícias que relatam a violência viva dentro das escolas. Para combatê-la, escola e sociedade devem atuar conjuntamente. Deve a escola promover atividades de integração entre pais, alunos e professores. Atividades de prevenção a violência como palestras e fóruns de discussão; atividades desportivas que envolvam as crianças e as desviem de eventuais vícios como drogas, bebidas e cigarro; atividades que proporcionem uma integração da escola com a comunidade, como festas, sábados esportivos, exposições abertas, arte, etc. A escola deve ultrapassar seus muros e invadir a comunidade. Deve ser aberta, funcionar como um espaço coletivo onde as crianças se sintam acolhidas e os pais tenham a oportunidade de acompanhar o desenvolvimento de seus filhos e conhecer as outras crianças e suas respectivas famílias.
A qualidade do ensino é também importante, não se nega isso. Mas é mister que escola e pais observem as outras necessidades do ser humano e as respeitem, garantindo o desenvolvimento da Inteligência emocional da criança. Um adulto equilibrado e sensato é muito mais importante para a sociedade do que um profissional extremamente eficiente, mas com sérios entraves no relacionamento interpessoal.
Crianças e jovens precisam ser vistos como seres humanos e respeitados em todas as suas necessidades, principalmente nas que concernem em seu bem estar psicológico. O que acontece com freqüência é que as crianças e seus problemas são deixados para segundo plano como se fosse possível um problema curar-se por si mesmo sem qualquer intervenção externa. Não há cura sem atenção, o que ocorre muitas vezes é que os problemas se internalizam, juntamente com as ausências e omissões. A criança se cansa de gritar clamando por ajuda e se cala, introjetando tudo aquilo que a incomoda já que ninguém a vê. Vive então uma inverdade, não demonstra seus sentimentos, isolando-se em um mundo a parte, até que um dia a revolta aparece e todos ficam horrorizados com a reação “desproporcional” da criança que simplesmente se enfadou de ser invisível aos olhos de todos.

Fernanda Maria Lozano Monteiro Sanches
Licenciatura em arte
A escola mata a criatividade?
O atual sistema educacional, apesar de ter evoluído para uma educação mais humanista e menos tecnicista, ainda mantém uma estrutura pouco flexível. As avaliações continuam pouco diversificadas, não apontando o real desenvolvimento dos alunos frente à matéria estudada. É muito comum a valoração daquilo que foi transmitido por meio de provas objetivas, que não contemplam o que o aluno compreendeu sobre o assunto, limitando-se a uma resposta certa para questionamentos que muitas vezes resultariam em uma reflexão mais aprofundada e verdadeiramente indicativa de compreensão.
Muitas vezes o comportamento do aluno em classe e o fato de o mesmo estar dando o seu melhor não é levado em consideração, dando-se um peso maior a uma avaliação programada para determinado dia e horário. O que ocorre é que indicativos mais significativos de interesse e dedicação são preteridos em favor das velhas provas.
O próprio sistema de aprendizagem sugere uma uniformização rígida nas conhecidas redes educacionais, nas quais o material didático e a aplicação dessas atividades são determinadas sem levar em conta a realidade social da escola e da comunidade em que ela se insere. A igualdade garantida constitucionalmente não indica que todos devem ser tratados da mesma forma porque todos são, em realidade, diferentes entre si e devem ser tratados de maneira desigual na medida de sua desigualdade. Assim, o sistema educacional para ser efetivo deve levar em conta a diversidade dos alunos, quer no que tange a sua personalidade, quer no que diz respeito a sua formação sócio-cultural.
Atualmente, a escola tem por finalidade primeira a eficiência que o capitalismo exige das pessoas. Não se reflete sobre a felicidade das pessoas enquanto seres humanos, sobre a necessidade de cada um encontrar seu lugar na sociedade, mas apenas em proporcionar oportunidades de emprego e conforto financeiro,que, diga-se de passagem, também são importantes e necessários, mas talvez não primordiais ou mais importantes do que a satisfação pessoal. Aqui entra, por exemplo, a hierarquia das disciplinas, onde as exatas ocupam posição de destaque e as que tratam da pessoa como ser humano em si são relegadas a segundo plano, como educação física, filosofia e artes.
O interessante é perceber que são justamente essas disciplinas que permitem o desenvolvimento de um jovem questionador, crítico, capaz de entender a si mesmo e o mundo que o cerca. Porém, a preferência não está em formar pessoas capazes de julgar e modificar o que está errado a sua volta, resultando num mundo melhor, mas em criar pessoas eficazes, não necessariamente inteligentes, mas capazes de produzir.
Estamos cercados de pessoas com medo de se arriscar, porque são tolhidos na infância pelo conceito de certo e errado. Talvez seja por isso que a humanidade tenha poucos gênios e muitas pessoas imersas na mediocridade, no saber “livresco” e raso, com pouca opinião sobre o que é melhor para a comunidade. São todos educados para o individualismo, para a satisfação imediata de seus instintos primitivos, sem senso de coletivo.
É preciso repensar a educação no sentido de que se leve em conta as várias habilidades do ser humano, não privilegiando uma em detrimento das outras, mas levando em consideração todo o conjunto, a fim de que tenhamos profissionais que amam o que fazem, pais conscientes da educação dos filhos, cidadãos participativos, empresários que se importam com o bem estar social, líderes democráticos...
A transformação da educação e, consequentemente, da sociedade depende dessa conscientização. Cientes do que deve ser modificado, cada um deve iniciar a transformação dentro de casa, depois dentro da comunidade, dentro da escola, e assim sucessivamente, até que se opere uma verdadeira modificação social.
O professor de Arte, por exemplo, deve se conscientizar da importância de sua disciplina na formação de pessoas melhores, preparar-se para adaptar os conteúdos a realidade dos alunos, a fim de que esses vivenciem a arte e percebam sua importância como fator de evolução social. Os alunos, envolvidos pelo processo, levarão para seus lares a necessidade da arte e os pais que, a princípio relutantes, também serão influenciados e convencidos de que a arte é um importante instrumento de reação a opressão e aos absurdos da sociedade moderna. Então a comunidade se renderá aos jovens questionadores que transformarão para melhor a nossa sociedade.
Trata-se de árdua tarefa, que enfrentará muita resistência principalmente daqueles que não têm interesse em uma sociedade mais justa e igualitária. Estudar arte está muito além de se tornar um artista, pois não serão todos que contarão com a aptidão e a criatividade necessárias, é se tornar capaz de compreender-se e entender a relação entre o artista,a obra e o público,bem como o que essa relação representa para a sociedade. A arte é uma linguagem que não se pode calar.

Fernanda Maria Lozano Monteiro Sanches
Licenciatura em Artes